ADOÇÃO DE CRIANÇAS
Paloma Nogueira e Dayane Trindade
Se perguntarmos para alguma criança qual o seu maior sonho, podemos ouvir as mais diversas respostas que vai do brinquedo mais caro a coisas mais simples como comer uma pizza naquele dia. Como saber o que se passa na cabecinha de cada uma delas? A fantasia e a realidade fazem parte do seu dia a dia, assim como a busca de compreender a realidade em sua volta. Para muitas das nossas crianças, o maior sonho de suas vidas é de ter uma família. De ser adotada.
Na cidade de Salvador existe cerca de 1.100 crianças divididas entre 32 instituições, fora as que são abrigadas em estabelecimentos filantrópicos e as que vivem nas ruas da capital baiana. Infelizmente, para a maior parte delas, a chance de serem adotadas cai a cada ano em que ficam mais velhas.
Segundo a assistente social, Taís Silva de Sousa, “a preferência da maioria dos casais que resolvem adotar uma criança é pelas recém nascidas, de pele clara e de sexo feminino”. Ao completar dois anos, a criança já é considerada ‘grande’, e a chance de passarem a conviver em uma família diminui.
Em uma cidade como Salvador, onde a maioria dos habitantes são afro descendentes, “o número de crianças negras disponíveis a adoção é muito grande, e com a preferência por parte dos interessados pelos bebês brancos, a fila de espera no juizado vai crescendo, aumentando o tempo de espera para os interessados”, confirma a assistente social.
Os abrigos
No ano passado, cerca de 150 crianças foram adotadas, só na capital baiana. O número de crianças com mais de um ano também aumentou significamente.
As instituições são divididas entre as que acolhem apenas meninos, ou só meninas e também existem abrigos que cuidam de ambos os sexos.
O Lar Luz do Amanhã faz parte no núcleo da Cidade da Luz que é presidido por José Medrado no bairro de Pituaçú, onde são acolhidas crianças do sexo masculino.
Fundada no ano de 1984, hoje o orfanato abriga 40 crianças, tendo a capacidade de abrigar 63 crianças e adolescentes, promovendo além da moradia e alimentação, oficinas profissionalizantes, assistência psicológica, psicoterápica e assistência odonto-médica.
Eliana Menezes, pedagoga e coordenadora do abrigo, informa que “as crianças são enviadas pelo juizado e aqui são acolhidas. Elas vêem com um histórico familiar e social considerado como situação de risco”. Muitas delas já sofreram algum tipo de violência e maus tratos.
O Lar Luz do Amanhã recebe crianças de 0 a 7 anos de idade e lá permanecem até completar maior idade. “Geralmente nós não separamos irmãos. Quando recebemos uma criança de 4, 6 anos e esse tiver um irmão de 14 anos por exemplo, nós recebemos ambos. Muitos vêem para cá com um histórico de abandono, e submete-los à uma nova separação é desnecessário”, explica a coordenadora.
As crianças que vivem no orfanato contam com atividades extra curriculares como o reforço escolar e atividades físicas e de artes. Geralmente eles fazem aulas como de capoeira, judô e natação fora do abrigo, que permite que eles tenham vida social como de qualquer criança ou adolescente. “Eles tem amigos fora do Lar, e desfrutam atividades de lazer, podendo ir a praia, ao parque sozinhos a depender da idade”, informa Eliana Menezes.
Apesar do trabalho ser realizado em cima do coletivo, cada criança da Cidade da Luz tem seus objetos pessoais como brinquedos, toalhas, roupas, etc. O instituto é mantido por convênios com a Prefeitura Municipal de Salvador, além de receber doações por parte da comunidade, além do trabalho voluntariado que pode ser os mais diversificados, trabalhando desde o berçário à atividades lúdicas com os adolescentes, acompanhados sempre por supervisão dos responsáveis pelo setor.
Nem todas as crianças que estão abrigadas nos orfanatos são passivas a adoção. “Algumas estão nas instituições sendo preparadas para regressarem à família de origem, que também passam por uma avaliação e acompanhamento psicológico, de forma que possam juntar novamente essas famílias”, informa a coordenadora, “como já aconteceu diversas vezes no Lar Luz do Amanhã”.
A situação é diferente para o Lar Irmã Benedita Camurugí. A casa de adoção abriga cerca de 126 crianças e é dividida em três unidades, uma na Baixa de Quintas, Cidade Nova e em Simões Filho. As crianças são sustentadas pelo pouco salário da aposentadoria de Nilzete Menezes, responsável e dona das instituições, de coletas de notas fiscais, além de doações da comunidade e “dos corações generosos”, assim nomeia ela. A instituição abriga meninos e meninas de 0 a 16 anos, que contam também com atividades regulares como qualquer outra criança da sua idade.
Escola pela manhã, reforço escolar pela tarde, além de atividades esportivas e extras como aula de inglês e informática. Dona Nilzete, como é chamada pelos seus filhos e funcionários que a ajudam no lar onde é também sua própria casa, conta com o apoio de cerca de 20 funcionários, que são psicólogos, assistente social, monitores, secretários, professores, coordenadora, entre outros. Sempre numa animação e agitação tremenda com todas as crianças, ela sustenta tudo com a maior dedicação e diz sobrar tempo para ajudar as outras pessoas. “Todo mundo precisa de atenção”, diz ela que além de tudo ainda distribui almoço para mendigos que moram ali perto e ficam na espera da sua “quentinha” todos os dias.
O Lar possui ainda um berçário que abriga de 45 a 50 crianças de 0 a 3 anos, “os meninos vão crescendo e a dificuldade de adotar é maior”, diz ela que apesar disso sempre se apega com todos que passam por lá. Enquanto contava a história de um garoto, que ela prefere não dizer o nome, que chegou lá com cinco meses e está lá até agora com 14 anos, ela se dividia em várias, para atender a todos que de cinco em cinco minutos a chamava. “O coração é grande, coração de mãe sempre cabe mais um”, conta ela que atendia a todos com a maior paciência.
Com o novo programa Retorno ao Lar, lançado em 2004 pelo Ministério Público Estadual e com o apoio do juiz da 1ª Vara da Infância e da Juventude, Dr. Salomão Resedá, que visa reinserir as crianças dos orfanatos de Salvador nas suas famílias de origem ou em uma família substituta, através de adoção, tutela e guarda, a instituição tem conseguiu recuperar o âmbito familiar de cerca de 26 crianças só esse ano. A reintegração acontece de forma gradual, principalmente quando o vínculo com a família está rompido. “Sete crianças daqui retornaram para seu pai esse ano, ele era alcoólatra, mas conseguiu se redimir e levou todos os filhos de volta pra casa”, afirma Nilzete que acha essa uma boa campanha do juizado.
Nova família
Margarida Campos sempre sonhou em ser mãe, mas seu esposo havia feito vasectomia depois do seu terceiro filho do relacionamento anterior. Foi quando decidiram adotar uma criança. Mas o casal não precisaram passar pela fila de espera da adoção.
A pequena Eduarda, hoje com 3 anos, nasceu na cidade de Feria de Santana, mas sua família biológica não tinha condições de criar a garotinha e resolveram entregar para quem pudesse dar-lhe uma vida mais confortável. “Recebi da mãe biológica quando ela tinha 5 meses e logo descobrimos que ela tinha câncer de abdome”, conta Margarida depois de ter sofrido um ano, praticamente morando no hospital onde a garotinha passou quase todo o tempo.
Agora Duda, como é chamada pela família e amigos, está recuperada e enchendo o lar da família Campos de muita alegria. “Nunca nos arrependemos de adotar Eduarda. Ela é a melhor coisa da minha vida”, desabafa a mãe emocionada e continua: “ela sabe que nasceu do meu coração”.
Os pais adotivos não pretendem ter uma nova criança em casa e explicam: “Duda é a filha que sempre sonhei em ter. Estou muito feliz com ela”, e decidiram que vão contar para a menina que ela foi adotada no momento em que julgarem correto, para que ela possa compreender sua história de vida.
Quando o filho cresce
Nascida na pequena cidade de Amargosa no interior do recôncavo baiano, Viviane Nascimento, estudante, nasceu numa pequena casa de farinha, lugar onde dava sustento aos seus cinco irmãos. Sem condições de ser criada pela família, sua tia, lavadeira de um casal que mora em Salvador, resolveu então trazer a menina para capital. “Minha mala era apenas uma fralda descartável e uma blusinha amarela, a qual eu vestia”, conta ela que, até hoje, 22 anos depois, ainda guarda um pequeno travesseiro da sua viagem.
A historia de Viviane não é única, muitas crianças são trazidas do interior ou até mesmo tiradas das ruas e encaminhadas a casas de família para serem adotadas “Sou muito grata por tudo o que minha família me proporcionou; amor, educação, felicidade”, diz ela que acredita que o mundo seria muito menos frio se cada um pudesse oferecer amor e carinho a quem precisa.
Para adotar uma criança
O Juizado da Infância e da Juventude informa que o processo de adoção não é tão difícil como muitos pensam. A questão burocrática se faz necessário, pois visa promover o bem estar da criança, garantindo que ela terá meios de viver com dignidade. É o que defende o atual Juiz Dr. Salomão Resedá.
Para adotar, o interessado deve entrar no programa de adoção do Juizado da Infância e Juventude, ter mais de 21 anos, além de ter uma diferença mínima de 16 anos entre ele e a criança. deverá também apresentar atestado medico a ausência de doenças mentais ou físicas, não ter antecedente criminal, atestado de idoneidade moral (firma reconhecida), apresentar documentos pessoais como carteira de identidade e certidão de casamento (se for casado).
O interessado deve preencher uma ficha com os dados do tipo de criança que desejam adotar e aguardar até que o juizado encontre a criança que esteja o mais próximo possível das características solicitadas.
Ao localizar a criança, o solicitante deve comparecer ao juizado portando os documentos de certidão de nascimento, histórico escolar, além dos pais do adotando. A partir daí, participa de uma entrevista com psicólogos e assistentes sociais que vão analisar as possibilidades da desejada adoção. Depois desse processo, a pessoa recebe a visita domiciliar do serviço social que emite um relatório para o juiz afirmando que a pessoa está apta para a adoção.
Muitas pessoas desistem da adoção pelo processo burocrático que são submetidas (por conta das exigências que são contrárias às que estão passíveis a adoção), e acabam por acolher, ilegalmente, crianças em casa e passam a tratar como filhos, dando-lhes os mesmos direitos e oportunidades que o biológico teria. Mas também existem casos de pessoas que acolhem menores para trabalho infantil e vendas de órgãos, o que vem sendo bastante discutido por profissionais da área.
Para garantir o bem estar físico e psicológico dos menores, o acompanhamento Legal se faz imprescindível, pois elimina qualquer hipótese de que o sujeito seja mal tratado e submetido a violências da ordem.
Adoção internacional
Os critérios para adoção de crianças por estrangeiros por muito tempo foi pouco divulgada, mas com a procura cada vez maior, principalmente por italianos que preferem as crianças maiores (em torno dos 7 anos de idade), o Juizado da Infância e da Juventude vem promovendo campanhas e divulgados sobre o tema.
O processo é muito parecido com a adoção nacional, porém conta com algumas exigências como a de habilitação prévia na CEFIJ (Comissão Especial para Assuntos de Família, Infância e Juventude) e estágio de convivência com a criança, em Salvador, por um dos cônjuges (preferencialmente ambos), por um período de seis meses.
Além dos documentos citados para uma adoção nacional, o estrangeiro deve também apresentar passaportes, lei pertinente à adoção no pais de origem e submeter-se a um estudo psicossocial do casa e estarem devidamente habilitados à pretensa adoção, consoante as Leis do seu país.
Adoção Temporária
Falar das campanhas promovidas pelo Poder Judiciário como a de adoção temporária como as que são apresentadas nas festas de final de ano, conhecidas como Natal em Família, vem dividindo opiniões não só por parte da sociedade, mas também dos abrigos.
Ao serem entrevistados, alguns funcionários de orfanatos pediram que a sua identidade e a do orfanato fosse mantido em sigilo para não comprometerem a Instituição, uma vez que ela é formado por um grupo pessoas que tem opiniões e ponto de vista diferentes sobre o assunto.
O primeiro passo para adotar temporariamente uma criança na época do natal é dirigir-se ao núcleo de assistência social e se cadastrar. O juizado seleciona algumas crianças de cada abrigo, geralmente duas e encaminha para os interessados.
O problema surge a partir do critério de tempo, o qual a criança permanece com a família. Geralmente ficam cerca de um mês. Quando essas crianças voltam para os abrigos, elas trazem consigo uma esperança de ser adotada pelas pessoas com quem conviveu por aquelas semanas, mas uma nova decepção acontece a partir do momento o qual ela se sente rejeitada por não ser adotada.
“O interesse do Juizado é empurrar as crianças para serem adotadas, e isso quase nunca acontece. Elas voltam para cá muito tristes e abre uma nova ferida neles”, desabafa um dos funcionários de um orfanato que prefere ficar anônima, com receio de criar problemas entre o juizado e o abrigo.
Segundo dados obtidos pelo Juizado da Infância e da Juventude, a intenção é de que haja pelo menos 12 adoções nesse período.
Quer saber mais?
Poder judiciário: tel. 0800 713020, ou acesse: http://www.tj.ba.gov.br
Lar Luz do Amanhã: tel. 3363 5161, ou acesse: www.cidadedaluz.org.br
Viver Adoção: Associação de Pais Adotivos e Amigos: tel. 3358 0414, ou escreva: viveradocao@ig.com.br
Dia Nacional da Adoção: 25 de maio